sexta-feira, 12 de março de 2010

A façanha dos Sarney




Mesmo apoiada por Lula, candidato à reeleição em 2006 com ampla vantagem que se consumou, e detendo o monopólio da comunicação do estado do Maranhão, a então senadora Roseana Sarney perdeu, no segundo turno, as eleições para o governo do estado em que sua família, além de dona de terras, é dona do mar e tem seu nome carimbado em avenidas, travessas, ruas, vilas e prédios públicos do Maranhão. O vencedor do pleito fora Jackson Lago (PDT), disposto a enterrar a oligarquia Sarney, assim como este pretendia fazer – e fez – com Victorino Freire, antigo oligarca maranhense, de quem Sarney fora aliado na juventude (embora, hoje, renegue isso com a mesma veemência com que renega sua desonestidade).



Três vezes prefeito de São Luis, capital do Maranhão, Jackson Lago vencera Roseana Sarney no segundo turno das eleições estaduais de 2006 com 52% dos votos válidos. (Pesquisa Ibope encomendada pela TV Mirante, filial da TV Globo pertencente à família Sarney no Maranhão, apontava a vitória para Roseana no 2º turno das eleições). A população comemorou a derrota de Roseana (mais que a vitória de Lago).



A tensão entre o novo e o antigo governo no estado já era prevista desde a eleição de Jackson Lago, que detinha minoria na Assembleia Legislativa. Logo, a coligação derrotada entrou com um pedido de cassação do mandato do governador eleito, alegando obstrução da Legislação Eleitoral por meio do uso da máquina pública na campanha eleitoral, doações de cestas básicas e kits salva-vidas para compra de votos na região de São Marcos, em São José de Ribamar; transferência de recursos públicos para uma associação de moradores do Grajaú; distribuição de combustível e material de construção para os eleitores; 17 mil reais para compras de votos e favorecimento do candidato Lago pelo então governador José Reinaldo Tavares, do PMDB, ex-aliado do clã Sarney. Em sua defesa, Lago afirmou que não havia nos autos provas concretas, mas alegações. A sua defesa, na época da cassação, disse que "a força eleitoral de Jackson Lago se manifestou onde não houve convênio nenhum". (Em São Luis, o maior colégio eleitoral do Maranhão, Lago recebera 66% dos votos. Não consta nenhuma denúncia envolvendo compra de votos na capital do Maranhão).



Cassado pelo STF em 16 abril de 2009, Jackson Lago deixou para Roseana Sarney o Palácio dos Leões (Sede do Governo do Estado do Maranhão) e suspeitas de gastos superfaturados com aviões, além da dúvida acerca do uso da máquina pública e de compras de votos para elerger-se, mesmo que ele tenha sido condenado. É estranho duvidar de quem é condenado; pior ainda é duvidar de quem julga. Mas a situação pede, pois, além da declaração de Lago e seu advogado, citadas acima, a defesa do acusado tivera direito a apenas seis testemunhas no processo. E a família Sarney mantém relações estreitas com alguns membros do STF.



Em 19 de março de 2009, o novamente presidente do Senado José Sarney foi ao Amapá por ocasião da festa do padroeiro do estado, São José. Lá, segundo o livro “Honoráveis Bandidos”, do jornalista Palmério Dória, encontrou-se com o presidente do STF, Gilmar Mendes. Um mês depois, Lago e seu vice Luis Carlos Porto estavam cassados. (Fato inédito. À renúncia de Collor, assumira o cargo seu vice, Itamar Franco e, na crise do “mensalão do DF”, à prisão de Arruda, assumiu, por pouco tempo, seu vice, Paulo Octavio). O relator do processo fora o ministro do STF Eros Grau, a quem Sarney prometera uma cadeira de imortal na ABL assim que um dos imortais vivos morrer.



Pai e filha cometeram uma façanha política maior que o fato de Sarney ostentar título de imortal na ABL. Valeram-se da Lei Eleitoral, que proíbe, dentre outras coisas, a compra de votos (por meio de cestas básicas, brinquedos, dinheiro em espécie e afins) e o uso da máquina pública para favorecer candidato, para voltar ao poder de 40 anos no estado do Maranhão. Poder que rendeu à família o monopólio da comunicação no estado – além da TV Mirante, são donos do jornal Estado do Maranhão, da Rádio Mirante AM e FM; no interior do estado, são donos de outras 35 emissoras de rádio e 13 retransmissoras da TV Mirante – e que iniciou-se com a necessidade do governo militar – em 1965 – em investir em infraestrutura energética na região amazônica nordestina com a construção da usina de Boa Esperança, no rio Parnaíba, que corta os estados do Tocatins e do Maranhão, e ter alguma força regional que os ajudasse a controlar o projeto. A Boa Esperança é apenas o início do domínio da família sobre o setor elétrico brasileiro. A ela, seguiram a superfaturada construção da hidrelétrica de Tucuruí, o comando da Eletronorte, o contrato com a empresa americana de alumínio Alumar (que, para produzir o alumínio necessita de muita energia; seus contratos foram feitos com a família Sarney) e contratos de energia com a construtora Camargo Côrrea. O domínio no setor é consolidado com Sarney na presidência da República e mantido até hoje. Silas Rondeau e Edison Lobão – respectivamente, o último e o atual ministro das Minas e Energia – foram indicados por Sarney, que, junto de Lobão, detém o comando sobre a Eletrobrás, que hoje, assim como a Petrobrás, opera sem necessitar de licitação (muito conveniente para os dois).



Além da energia e das comunicações, a família Sarney é dona da Ilha de Capuru (e não apenas de sua porção de terra, como das 15 praias que a envolvem, segundo o livro “Honoráveis Bandidos”), de uma casa de R$ 4 milhões em Brasília, tomou a si o Convento das Mercês (de 1645, erguido pelo Padre Antonio Vieira, localizado em São Luís) e o transformou Acervo Memorial José Sarney (até fechar, por conta dos escândalos envolvendo a família em 2009), apoderou-se do Senado por meio da indicação de Agaciel Maia para diretoria-geral e da Justiça – não apenas no caso da cassação de Jackson Lago, mas também no da censura prévia ao jornal O Estado de São Paulo – determinada pelo desembargador Dácio Vieira, do TJ-DF, que chegou ao cargo por meio de Sarney.



Há mais de sete meses o jornal está proibido de publicar matérias sobre a Operação Boi Barrica, da PF, que investiga as empresas de Fernando Sarney. Em 2009, o Estadão, além da Boi Barrica, revelou casos de nepotismo (atos secretos foram utilizados para nomear duas sobrinhas, um neto e afilhados políticos), patrimonialismo (a empresa de José Adriano Cordeiro Sarney, neto do senador, operava um esquema de crédito consignado desde 2007) e clientelismo (como as trocas de favores entre Sarney e Agaciel, reveladas por meio de grampos da PF) envolvendo o senador José Sarney. As denúncias foram devidamente arquivadas pelo Conselho de Ética do Senado, em 18 de agosto de 2009. A oposição recorreu ao STF que, em 31 de agosto de 2009, optou pelo arquivamento das mesmas.



Em 10 de dezembro, por 6 votos a 3, o jornal O Estado de São Paulo é mantido sob censura. Gilmar Mendes e Eros Grau fazem parte dos 6 ministros que optaram por desobedecer o Art. 5º/ parágrafo IX da Constituição de 1988 (“IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;), carta que eles deveriam guardar.




Fontes:
DÓRIA, Palmério. “Honoráveis Bandidos”. Geração Editorial. 1ª edição. 2009;
Jornais: Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, O Globo. (Versão imprensa e online);
Site jornal O Imparcial (do Maranhão). (www.oimparcial.com.br);
Site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE): (www.tse.gov.br/internet/eleicoes/2006);
Código Eleitoral Brasileiro.

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